domingo, 8 de maio de 2016

ENCICLOPÉDIAS ALEGRES (10) - BRUXAS

JANELAS. Devem estar abertas na passagem do ano e as luzes acesas, para assim receber o ano novo com bonomia. O mesmo se deve fazer com as portas, principalmente a da entrada da casa. É claro que também se estará sujeito a receber o amigo do alheio, mas devemos lembrar-nos que somos “assaltados” com taxas, impostos, alcavalas e portagens, mesmo com tudo fechado.
JOGOS. O único jogo que parece ser do agrado das bruxas – para além dos que praticam nas salas de bingo – é o de jogarem com os bebés depois de os retirarem dos berços durante a noite. É uma espécie de ténis sem raquete, mas com o preciosismo de Maria Sharapova e Roger Federer. Devolvem as crianças logo que desponte a manhã, sem um único arranhão ou fralda suja.
Quando não têm outra ocupação mais gratificante, as bruxas quebram o protocolo, juntam-se e fazem uma perninha de quatro para jogarem scrabble ou simplesmente, a solo, preencherem palavras cruzadas ou às voltas com o portátil para moerem a paciência no freecell.
LAPSOS. Este aviso é para toda a navegação que singra nestes mares. Cuidado com os enganos, principalmente nos esconjuros!
Por exemplo: para que uma criança não esteja sujeita a bruxedos, deve rezar-se o credo na cerimónia do baptismo com cuidado, pois um engano atrairá irremediavelmente a bruxaria.
LIVROS. Para além do Manual das Bruxas, que deve ter uma edição limitada, semelhante às da banda desenhada portuguesa, há outras obras escritas por atrevidos que não pescam nada do assunto (como é o meu caso) e que parágrafo sim parágrafo não metem os pés pelas mãos, limitando-se a copiar e colar o que vão espreitando pelas ligações do Google.
Bruxa que se preze deve possuir o Grande Livro de São Cipriano, bem como o Primo Basílio, a maior parte – se não toda – a obra de José Rodrigues dos Santos e a colecção dos anuários de estatística do INE.
As bruxas, no entanto, têm um “livro das sombras” que elas próprias escrevem à mão (hoje devem fazê-lo no mais recente Microsoft Word) como se fosse um diário. Este livro tem a particularidade de não sobreviver ao autor, ao contrário das obras premiadas com o Nobel da Literatura. Este livro deve ser queimado logo após o último suspiro da bruxa.
Querer pretender adquirir livros de bruxaria e feitiçaria à moda antiga pela internet, é como tentar encontrar online um catálogo de zarabatanas de paxiúba do Amazonas (não confundir com os livros vendidos na Amazon, embora haja por lá obras mais eficazes que as zarabatanas do rio Içana).
LOBISOMENS. Não há município que se preze sem que apresente uma lenda local em que entre um lobisomem. Para ser mais exacto, são os lobisomens e as mouras encantadas quem preenche a maior parte do repertório tradicional destas terras.
O lobisomem ou homem lobo, que na forma erudita se diz licantropo é um ser lendário e mitológico. Transforma-se em noites de lua cheia e só volta à forma natural e humana pelo amanhecer. Não contam os que acamaradam pelas vielas do Bairro Alto.
Para se entrar melhor no espírito da superstição e do seu folclore, é melhor seguir estes items.
- Quando nascem, do mesmo casal, sete filhos machos ou sete filhos fêmeas seguidos, e se não forem uns padrinhos dos outros, qualquer deles pode vir a ser lobisomem.
- Se num casal nascem sete rapazes, o último será lobisomem; se sete raparigas, a última será bruxa. Com os baixíssimos índices sintéticos de fecundidade, com 1,25 filhos por casal em média, ainda com as também pequeníssimas taxas brutas de reprodução, não admira que estejam em vias de extinção as duas classes.
- Um filho gerado entre compadre e comadre virá a ser lobisomem. Não se comenta, por não se conhecerem as estatísticas.
- Também se pode transformar em lobisomem a criança cujo padrinho se esqueça de dizer certas palavras durante a cerimónia do baptismo.
- Para que uma criança, fadada para ser lobisomem não o seja, deve dar-se-lhe o nome de Bento, se for rapaz, e Jerónima, se for rapariga. Estes nomes têm o condão de evitarem o fadário. Reportando-me aos índices de natalidade atrás, não há necessidade de estes nomes virem aos registos com frequência, até porque nem são nada jeitosos.
- Evita-se que um filho se transforme em lobisomem se se queimar a primeira camisa que ele vestiu. Como é costume não levado em conta, não admira que andem para aí muitos…
- Só deixará de ser lobisomem todo aquele a quem alguém conseguir fazer sangue no rabo ou no dedo mindinho. Nem será pertinente dizer o sítio onde mais facilmente se poderá dar a pica.
- Quando se pica um lobisomem deve ter-se o cuidado de não apanhar os salpicos do seu sangue, pois passa o fadário para a pessoa que o feriu. Se o lobisomem não for bem picado e não sair sangue, aumenta-se-lhe o fadário.
- Deixa de ser lobisomem se alguém conseguir apanhar-lhe a roupa e deitá-la a um forno. É óbvio que não será fácil conseguir apanhar a roupa sem o dito ir a banhos. Talvez nos guarda-fatos lá da casa, quem sabe?
- Consegue-se apanhar um lobisomem atirando pedras ou paus à sua sombra. É bom que seja mesmo sombra em sentido literal, não vão ser apanhados os ministros e conselheiros sombra dos governos. Se calhar nem se perdia nada…
- O lobisomem transforma-se naquele fado nas noites das quartas-feiras e sextas-feiras. A alteração das terças para quartas deu-se para não coincidir com as extracções do euromilhões, mantendo-se a das sextas por imposição das bruxas, que fazem parte da geringonça que impõe maioria de votação naqueles quadrantes.
- Os lobisomens correm numa noite sete adros de sete freguesias.
- O lobisomem come gente, mas só rapazes de idades entre 1 e 14 anos. Atenção ao item seguinte…
- O lobisomem lança pela boca, nas manhãs das quintas-feiras e sábados, tudo o que come nas noites anteriores.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.